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Sistema Tributário Brasileiro prejudica o espírito empresarial

fevereiro 26, 2008

Durante muitos anos Valdir Soares trabalhou como motorista para dois médicos em São Paulo. Mas em determinado momento ele teve a chance de realizar um sonho: a loja onde comprava peças para a sua motocicleta foi colocada à venda. Soares e a sua mulher não perderam tempo em aproveitar a chance de tornarem-se pequenos empresários.
No entanto, após apenas um ano, ele voltou a ser motorista. “O negócio era bom”, explica Soares. “Mas o aluguel da loja subiu e precisamos de mais renda. Isso significaria contratar um mecânico para fazer consertos. Mas quando nos debruçamos sobre todos os impostos e custos, constatamos que isso seria impossível. Apareceu uma pessoa disposta a comprar a loja e nós desistimos do negócio.”
Um relatório recente do Banco Mundial revelou que uma companhia típica no Brasil precisa dedicar 2.600 horas por ano para pagar os seus impostos – isso faz com que o país fique em último lugar entre as 177 nações pesquisadas. Na Irlanda são necessárias apenas 76 horas.
As grandes companhias empregam exércitos de advogados para guiá-las através do labirinto de regulamentações.
Mas, ao se depararem com tal complexidade, muitos pequenos empresários ou vão à falência ou mergulham na “informalidade” – um termo muito utilizado no Brasil como um eufemismo para a sonegação de impostos.
Além dos impostos trabalhistas e as contribuições à previdência, as companhias têm de lidar com os impostos estaduais sobre as vendas – governados nos 26 Estados brasileiros e no Distrito Federal por 27 conjuntos de leis diferentes – bem como com inúmeros outros impostos sobre vendas, lucros e folhas de pagamento, nos níveis municipal, estadual e federal.
O fardo fiscal no país vem aumentando sistematicamente nos últimos anos, tendo chegado a um patamar de cerca de 37% do PIB (Produto Interno Bruto), tão elevado quanto o de muitos países desenvolvidos, sem entretanto resultar na qualidade dos serviços oferecidos por estes países.
Fábio Pina, da Fecomércio, uma associação de comércio com sede em São Paulo que faz campanha pela reforma fiscal, afirma: “Alguns impostos são pagos à União e repassados aos Estados, outros são distribuídos dos Estados para os municípios, e há ainda aqueles que são transferidos dos Estados para a União para depois serem redistribuídos aos Estados. É um vaivém monstruoso e desnecessário que é o legado de centenas de anos de imposições constantes de leis tributárias”.
O governo está sendo cada vez mais pressionado para dar um jeito nessa confusão.
Na semana passada, Guido Mantega, ministro da Fazenda, disse que uma proposta de reforma seria enviada ao Congresso Nacional até 28 de fevereiro.
Tal reforma vem sendo prometida desde que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu o cargo em 2003. Mas agora ela traz um incentivo extra: em dezembro o governo sofreu um forte golpe quando o Senado rejeitou uma lei no sentido de perpetuar a CPMF, um imposto sobre operações financeiras cujo valor total seria de cerca de R$ 40 bilhões (US$ 23,4 bilhões, ?16 bilhões, £ 12 bilhões) neste ano.
O atual sistema baseia-se bastante nos impostos sobre as transações comerciais que são ocultos do consumidor no ponto da venda, de forma que, no Brasil, os pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que os ricos.
Os índices de impostos variam bastante: no Estado de São Paulo o preço do frango, por exemplo, inclui 18% em impostos. Em se tratando de uma lata de refrigerante, o imposto é de 47%, e de uma lata de cerveja, 56%, de acordo com o Feirão do Imposto, um website que lista diversos exemplos desse tipo.
Uma reforma ampla significaria unificar os 27 diferentes impostos estaduais, assim como aglutinar ou simplificar outros impostos e contribuições previdenciárias.
Porém, os maiores Estados – aqueles que mais perderiam com qualquer reforma – são controlados pela oposição, o que torna tal mudança politicamente difícil.
Acredita-se que a proposta do governo envolva alguma maneira de simplificar os impostos estaduais sobre as transações comerciais, mas sem criar um imposto único sobre o valor das mercadorias. E é provável que os outros impostos de âmbito municipal não sofram nenhuma mudança.
“Reforma tributária é uma questão difícil, até mesmo nos melhores períodos”, afirma João Augusto de Castro Neves, um cientista político de Brasília.
Mas esta época não é das melhores: o governo está acuado pelo mais recente de uma série de escândalos de corrupção, que criou uma barreira entre ele e a oposição, e em outubro haverá eleições municipais das quais muitos parlamentares disputarão, o que complica ainda mais o delicado equilíbrio de forças que será necessário para uma reforma tão ambiciosa.
“Nós realmente não acreditamos que acontecerá algo de concreto”, afirma Castro Neves. Caso ele esteja certo, muitos aspirantes a empresários, como Soares, continuarão trabalhando em empregos que não exigem grande qualificação, em vez de criarem novos empregos como empresários.
Tradução: UOL
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Autor: Jonathan Whatley (Uol.com.br)

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